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24.11.05
Por que a gente é assim?
Tava lendo aqui sobre trauma de amigo oculto. Nem me fale em trauma de amigo oculto! Sabe aquela pessoa que sempre, SEMPRE, ganha presentes ruins? A única vez que eu ganhei um presente bom nessa brincadeira idiota foi em um da família, que minha vó me sorteou. Mas na escola, por exemplo, só ganhava lixo. Nada aproveitável. Aqueles presentes que tava na cara que tinham sido comprados de última hora, numa lojinha qualquer a caminho da escola. E no ano que vem, lá estava eu, participando de novo.
Pausa para explicação da dinâmica do amigo oculto escolar: na escola essas coisas eram meio obrigatórias. É uma coisa quase oficial, a professora administra o sorteio e as aulas até acabam mais cedo para a troca de presentes. Você não pode simplesmente se recusar a participar. Quer dizer, poder, pode. Mas isso eu só descobri muito tempo depois. Na época, não existia essa possibilidade.
Mas o pior é que eu sempre dava presentes bons, e minha mãe ainda fazia embrulhos bonitos, etc. Acho que minha mãe não conhecia a regra número um do amigo oculto: quanto melhor o presente que você comprar, pior o que vai ganhar.
Na quinta série, a menina que me sorteou esqueceu de levar o presente no dia. Começamos bem, hein? Pra resolver o problema, a professora decidiu que o presente que seria dela, seria entregue pra mim. Justo. (será que ela também ficou traumatizada por ter sido excluída desse jeito da brincadeira?.. mas também, quem mandou esquecer meu presente?)
Quem tinha sorteado ela era o repetente da sala, o menino mais velho, de cabelo comprido, que sentava no fundo, só tirava notas ruins, enfim, o "mau elemento" da turma. Preciso ainda dizer que eu era apaixonada por ele?
Pausa para uma explicação de vocabulário: Na época, não usávamos o termo "apaixonada" e ninguém ficava "a fim" de ninguém. A gente dizia que "gostava" da pessoa. Toda menina "gostava" de algum menino. A pergunta mais tradicional era "de quem você gosta?" Se a resposta fosse "de ninguém", ninguém acreditaria e começavam as fofocas. Afinal, todo mundo tinha que gostar de alguém. (quem inventa essas regras?)
Como eu enrolo, hein? Mas voltando... Na hora da troca de presentes foi aquele burburinho. As meninas que sabiam que eu gostava dele ficaram naquele estado pré-histérico que todo mundo que já viu muita mulher reunida sabe bem como é. Ganhei uma bermuda de helanca, que era a mãe dele que fazia. Acredite, na época isto era um presente bom. Para os padrões de amigo oculto, era um presente excelente.
Pausa para explicar a moda no meu tempo: bermudas de helanca estavam na moda. Não eram usadas só pra fazer ginástica, a gente usava pra sair também. Pelo menos na Tijuca. Lembrem-se que estamos falando dos anos oitenta.
Após um começo desastroso (o esquecimento do presente), tudo se encaminhava perfeitamente. Eu ganhei um presente do menino que eu gostava e, ainda por cima, o primeiro presente bom no meu histórico de amigos ocultos. O que poderia dar errado? Mas ninguém esqueceu que a bermuda não era pra ser minha, né? Era um presente para outra menina, que, obviamente, não tinha a bunda do tamanho da minha.
Pausa para uma explicação anatômica (mas essa história não termina nunca?): pegue qualquer foto minha quando criança e só um pensamento virá à sua cabeça: essa menina não escapa de uma super lordose.
No final da brincadeira, o menino veio falar comigo e disse que se eu quisesse trocar o tamanho, era só falar com ele. Ah, que isso, imagina, está ótima, adorei. Etc. Minha mãe também quis que eu trocasse. Para mães, tudo é simples.
E passar a vergonha de dizer para o menino que minha bunda gigante não cabia na bermuda? Teria que mudar de colégio depois disso.
Nunca usei a bermuda.
Mas mantive a dignidade.
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